EDITORIAL

Mateus 9.21

Pois dizia essa mulher consigo mesma: “Se eu conseguir apenas lhe tocar as vestes, serei curada”. (Mateus 9.21)

Terça-feira passada, na célula de jovens mulheres, participamos de uma reflexão sobre a cura da mulher hemorrágica. Muitas coisas foram ditas naquele estudo e voltei para casa muito impactada por tudo o que conversamos. Mas uma coisa ficou martelando na minha cabeça. Aquela mulher correu muitos riscos em busca da sua cura: ela era impura e não podia tocar em ninguém, mas se escondeu na multidão; ela estava enfraquecida por uma longa enfermidade, mas mesmo assim ela estava no meio da multidão; ao tocar em um sacerdote, ela o tornaria impuro para suas funções, então seria muito complicado tocar em Jesus. Aí, bem aí, se esconde o detalhe.
Em nenhum momento da narrativa, em nenhum dos evangelhos, se diz que ela queria tocar Jesus. Ela vem por baixo, por trás de Jesus, e toca na borda do seu manto. Sem encostar nele propriamente, ela queria ser abençoada sem prejudicar. Ela queria ser curada sem provocar celeuma. Ela queria resolver seu grande problema sem alarde. Ela creu que a roupa seria suficiente. Ela não queria prejudicar Jesus falando com ele em público, expondo sua “imundície” ritual perante todos, colocando as pessoas em risco.
Existe muita gente neste mundo com uma necessidade real de Jesus. Gente que está se esgueirando pelos cantos, vindo por baixo das multidões, se escondendo por que tem medo, vergonha ou dor. Gente que sabe que só Jesus resolve seu problema, mas que não quer perturbar nosso culto, nossa liturgia, a arrumação de nossas vidas santas e imperturbáveis com seus problemas. Essa gente entra e sai de nossas igrejas sem dizer palavra, esperando apenas uma bordinha de manto para ser curada da doença que faz a vida esvair como sangue de hemorragia, anos e anos, sem parar.
E nós, que andamos de manto, podemos estar em um estado de desatenção, em atordoamento pela multidão de quem tanto gostamos, que não percebemos que nós saiu virtude. Tem gente que já foi curado e foi embora sem nos darmos conta da presença. Mas não é assim nosso mestre. Ele sente que dele saiu virtude, mesmo que o toque sequer tenha chegado em seu corpo. Ele percebeu a mexida do manto e a graça se estendendo no corpo da mulher curada. E Ele quer saber o que aconteceu. Ele quer olhar nos olhos da mulher. Ele quer que ela saiba que é “filha”, que não incomoda, que não é desimportante. Ele quer ouvir a voz dela, ver seu rosto e despedi-la com uma palavra de recomeço. Jesus não se preocupa com o que os outros vão dizer, com o que a multidão vai se ocupar, com as críticas eventuais. Ele sabe que pessoas que se esgueiram porque querem uma oportunidade são muito mais importantes do que aquelas que amam o palco, a exposição e o microfone na mão. Jesus sempre faz a mesma escolha. Se quero ser como Ele, tenho de manter a sensibilidade em alerta. Tenho de saber exatamente quando sai virtude de mim e não permitir que as pessoas sigam invisíveis em suas realidades. Tenho de reafirmar que a fé delas as salvou, que elas podem ir em paz, que estão livres do seu mal e que são filhas de Deus. (Hideide Brito Torres)